Entrou em vigor nesta quarta-feira (6) o tarifaço imposto pelos Estados Unidos aos produtos brasileiros, que eleva de 10% para 50% a taxa de importação sobre centenas de itens. A medida, anunciada pelo presidente Donald Trump em julho, ocorre em meio a uma escalada de tensões diplomáticas entre Washington e Brasília, agravada por embates políticos, ideológicos e comerciais sem precedentes na relação bilateral.
A nova política tarifária torna os produtos brasileiros menos competitivos no mercado norte-americano, já que o custo extra tende a ser repassado aos consumidores ou desestimular a compra. De acordo com a Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs), o impacto pode ser de R$ 1,5 bilhão no PIB gaúcho, com 20 mil empregos em risco. Cerca de 85% dos produtos industriais exportados pelo RS aos EUA estão sujeitos à nova tarifa.
“A indústria gaúcha está entre as mais penalizadas. O momento exige medidas emergenciais e diplomacia ativa para mitigar os efeitos dessa crise comercial”, declarou Claudio Bier, presidente da Fiergs.
Crise diplomática e atritos políticos
Embora o tarifaço tenha motivação econômica, o contexto da decisão é amplamente político. A relação entre os dois países se deteriorou desde o início do atual governo brasileiro. Entre os episódios que causaram desgaste direto com a Casa Branca, estão:
– Uma declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva comparando Donald Trump ao nazismo;
– A primeira-dama Janja Lula da Silva ter dito publicamente “fuck you, Elon Musk”, empresário e aliado político de Trump;
– A aproximação do governo brasileiro com regimes autoritários, como Venezuela e Irã;
– A comparação feita por Lula entre a ação militar de Israel em Gaza e o Holocausto sofrido pelos judeus durante a Segunda Guerra Mundial, o que gerou fortes reações internacionais, especialmente nos Estados Unidos.
Além disso, a diplomacia brasileira vem sendo criticada por sua posição ambígua em relação à guerra na Ucrânia. Brasil, Índia e China foram classificados por analistas e entidades internacionais como os três maiores financiadores indiretos da Rússia, ao manterem relações comerciais e compras de commodities que sustentam a economia russa durante o conflito.
“A sequência de ações e declarações do governo brasileiro tem isolado o país em importantes frentes diplomáticas. Os EUA, sob Trump, veem o atual governo brasileiro como um adversário direto, tanto do ponto de vista ideológico quanto geopolítico”, analisa Fabrício Pontin, professor de relações internacionais da Unilasalle.
Reação do governo brasileiro
Em resposta à medida, o governo Lula prepara um plano de contingência para atenuar os impactos sobre a economia, com linhas de crédito, isenção de tributos e estímulo à manutenção de empregos. A ideia é inspirar-se em medidas adotadas após a enchente no RS, como financiamento especial e prorrogação de obrigações fiscais.
Apesar do tarifaço, os EUA publicaram uma lista com 694 produtos isentos da nova taxa, o que atenua parcialmente os efeitos. Alguns setores, como o aço, receberam tratamento tarifário específico. Ainda assim, o impacto é significativo, e há espaço para negociações pontuais, segundo o próprio governo norte-americano.
Histórico de tensões
Para analistas, a relação entre os dois países vive seu pior momento desde o fim da ditadura militar. O agravamento da situação jurídica de Jair Bolsonaro, aliado de Trump, também aumentou a tensão. Após a decretação da prisão domiciliar do ex-presidente brasileiro, o Departamento de Estado norte-americano condenou publicamente a decisão, afirmando que responsabilizará quem facilitar condutas sancionadas.
A atuação do Brasil no Brics, especialmente ao propor transações comerciais fora do dólar, também irritou Trump. Em julho, Lula voltou a defender a criação de uma moeda própria do bloco, e o presidente norte-americano respondeu dizendo que “não deixará ninguém atacar o dólar”.
Com informações: Jornalista Fernando Kopper