O agronegócio brasileiro enfrenta uma onda crescente de pedidos de recuperação judicial, um reflexo do endividamento elevado e das condições adversas do setor. Em 2024, o número total de pedidos de recuperação judicial (RJ) no país atingiu 2.273 casos, a maior marca da década, representando um aumento de 61,8% em relação ao ano anterior. Entre produtores rurais, o crescimento foi ainda mais expressivo: os pedidos saltaram 138%, passando de 534 em 2023 para 1.272 casos no ano passado, conforme levantamento da Serasa Experian.
A tendência de crescimento se mantém em 2025. No primeiro semestre, os produtores rurais registraram 700 pedidos de recuperação judicial, ante 320 no mesmo período do ano anterior, um salto de 45%, segundo o advogado Euclides Ribeiro Silva, especialista em recuperação judicial do agronegócio. Para ele, a causa central do endividamento é o custo elevado do dinheiro, com juros que chegam a 25% ao ano, enquanto fatores como preço de insumos, clima e flutuações das commodities, embora relevantes, não explicam completamente o problema.
“O agronegócio representa quase 30% do PIB nacional e, sem políticas de crédito adequadas, muitos produtores recorrem à recuperação judicial como única saída”, destacou Ribeiro Silva. A utilização massiva desse instrumento, afirma o especialista, também derruba a narrativa de que os produtores são maus pagadores.
O advogado Eduardo Berbigier, do escritório Berbigier Sociedade de Advogados, reforça que o aumento das recuperações judiciais começou em 2023, motivado pela queda no preço das commodities e pela alta do dólar, que elevou o custo de insumos cotados em moeda estrangeira. “O saco de soja, por exemplo, caiu de R$ 200 em 2022 para R$ 92 em 2025, tornando inviável a manutenção do ponto de equilíbrio”, explicou.
Do total de R$ 12 bilhões em pedidos de recuperação judicial, cerca de R$ 3 bilhões pertencem ao agronegócio, segmento que historicamente não utilizava esse mecanismo. A inadimplência crescente eleva o risco financeiro e os juros bancários, comprometendo a capacidade de investimento no campo.
O cenário ainda pode se agravar. A eventual tributação das LCAs (Letras de Crédito do Agronegócio) e os efeitos do tarifaço dos Estados Unidos, que impacta especialmente o setor, pressionam ainda mais os produtores. “Dos US$ 40 bilhões afetados pelo tarifaço, US$ 12 bilhões atingem diretamente o agronegócio”, alertou Berbigier.
Especialistas apontam que uma saída seria a redução da taxa Selic, atualmente em 15% ao ano, para diminuir o custo do crédito e reduzir o risco sistêmico. “Sem isso, a capacidade de produção do país está em risco”, concluiu Ribeiro Silva, destacando a urgência de medidas estruturais para garantir a sustentabilidade do setor mais estratégico da economia brasileira.
Com informações: Jornalista Fernando Kopper