POR: JOÃO VICTOR C. DOS SANTOS, ESTUDANTE DE CIÊNCIA POLÍTICA E HISTÓRIA. FUNDADOR E LÍDER DO GRUPO BARÕES DA RESTAURAÇÃO. MANTENEDOR DO SITE BRUMAS DO PASSADO.
O ano era 2015, eu estava no 3º ano do Ensino Médio, e tinha ganhado meu primeiro PC: um netbook. Logo instalei um jogo que há tempos um amigo meu falava: Darkest Hour, um jogo de estratégia ambientado no século XX, que combinava política, economia e guerra em um tabuleiro digital.
Passei inúmeras horas jogando, tentando entender como funcionavam aquelas engrenagens complexas. No início, minha maior dificuldade era lidar com a Crise de 1929. Todas as vezes que esse evento surgia, minha economia entrava em colapso, o povo se revoltava e o país mergulhava no caos. Eu não compreendia o que estava acontecendo — apenas via o fracasso repetido e inevitável das minhas decisões.
Até que um dia, em uma aula de História, meu saudoso professor Rodrigo explicava que, durante a Crise de 1929, a União Soviética sofreu menos que os países ocidentais justamente por ter uma economia planificada, mais isolada das flutuações do mercado internacional. Com isso, testei essa teoria no jogo. Em cada oportunidade, movia os indicadores econômicos para um modelo mais centralizado, inspirado no modelo soviético.
Qual foi o resultado disso? Quando a crise veio, o meu país passou praticamente ileso. A economia permaneceu estável e, pela primeira vez, consegui avançar na campanha. Mais tarde na partida, ajustei novamente os parâmetros para uma economia de mercado – afinal, percebi que, a longo prazo, a planificação excessiva limitava o desenvolvimento tecnológico e a eficiência produtiva.
Aquela simples experiência me mostrou que o aprendizado pode nascer da curiosidade e da experimentação. O jogo havia se transformado em um laboratório de História, onde eu podia aplicar conceitos, testar hipóteses e observar resultados. E o mais interessante é que eu não estava apenas “jogando” — eu estava raciocinando historicamente, algo que muitas vezes é difícil de alcançar apenas com leituras ou exposições teóricas. Naquela partida, eu era a pessoa que estava tomando decisões políticas, econômicas e militares, e aprendendo sobre como essas decisões impactam interna e externamente.
Depois de Darkest Hour, fui conhecendo outros jogos do mesmo gênero, como Europa Universalis e Victoria, cada um com sua complexidade própria. Esses títulos me permitiram compreender como fatores políticos, tecnológicos, religiosos, militares e culturais se entrelaçam ao longo do tempo. Jogar deixava de ser apenas lazer: era uma forma de entender a lógica da História, de perceber como as decisões humanas moldaram o destino das sociedades.
Os jogos de estratégia têm esse poder transformador. Eles colocam o jogador no papel de agente histórico, alguém que precisa pensar como um governante, um diplomata ou um estrategista militar. É um tipo de aprendizado ativo, onde o erro não é um fracasso, mas uma oportunidade de descobrir por que algo aconteceu de determinada maneira. Enquanto em sala de aula estudamos o passado “feito”, no jogo temos a chance de refazer o passado, explorando caminhos alternativos e compreendendo melhor as consequências das escolhas.
Além de estimular habilidades fundamentais como planejamento, análise, gestão de recursos e pensamento crítico, outro aspecto importante é que jogos como esses despertam curiosidade intelectual. Depois de jogar, é comum querer pesquisar o que realmente aconteceu, entender quem foram os personagens reais, ou descobrir o contexto de uma guerra ou revolução. Eles fazem o estudante ir além do conteúdo da escola, buscando o conhecimento por vontade própria — algo que todo educador sonha em ver em tempos em que a atenção dos jovens é disputada por tantas distrações digitais.
Por isso, acredito que o uso de jogos de estratégia e simulação poderia ser incorporado ao ensino formal de História, como ferramenta complementar às aulas tradicionais. O professor poderia, por exemplo, usar esses jogos para ilustrar processos históricos, permitir que os alunos testem cenários alternativos ou compreendam de forma prática conceitos como economia, diplomacia e poder. Assim, o aprendizado deixaria de ser apenas passivo e se tornaria uma experiência participativa, em que o aluno vivencia o passado para entender o presente. No fim das contas, foi exatamente isso que me aconteceu — aprendi jogando, mas, acima de tudo, aprendi a querer entender mais sobre o mundo e sobre a própria História.